PRUDÊNCIA, SENHORES!


Por Yolanda Lima Lobo 

Gostaria de manifestar a minha perplexidade com a situação atual que estamos vivendo na UENF. A Universidade Estadual Norte Fluminense parece estar ameaçada de vir a abrigar no seu recinto, nos últimos cinco ou seis anos, os mais ferozes e truculentos adversários do modelo de universidade elaborado por Darcy Ribeiro. Desde quando um colegiado executivo - que deve ocupar-se de atividades-meio - se arvora no direito de fazer proposta de leis, assumindo funções que são dos órgãos pensadores das atividades-fins da universidade? Desde quando um colegiado executivo se julga competente para alterar proposta de trabalho dos docentes? A minuta de Projeto de Lei que tem a pretensão de regulamentar o regime de trabalho dos professores da universidade, feita pelo atual vice-reitor e com a aprovação dos diretores de Centros, é um tiro de canhão no modelo de universidade criado por Darcy Ribeiro.

A criação da Universidade Estadual Norte Fluminense, por imperativo constitucional, foi uma oportunidade que proporcionou a Darcy o desafio “de repensar a universidade, em suas estruturas e em suas funções” para que ela corresponda às novas exigências dos tempos modernos”. Darcy não queria criar mais uma universidade regional formadora de pessoal do tipo comum. Ele pensou “criar a Universidade Nova de que o Rio e o Brasil precisam. Uma Universidade do Terceiro Milenio”. Uma universidade cujo tema principal é o estudo do Brasil como problema. Seu objetivo “é dominar todo o saber humano, especialmente as novas tecnologias de ponta, para nessa base diagnosticar as causas do nosso atraso e abrir linhas para o desenvolvimento nacional pleno e autônomo.” Os princípios norteadores e sustentadores do modelo estrutural da UENF -  de liberdade,  de inteligencia, de estímulo à observação, à experimentação – devem ser capazes de impedir “a orgia de formalismos” revestidos numa burocracia inoperante que reina nas instituições brasileiras e restaurar o caráter de serviço integralmente público das universidades. Desse modo, Darcy organiza a estrutura da nova Universidade de modo que “professores e alunos se dediquem integralmente as atividades-fins dos Laboratórios que compõem os Centros”.  A dedicação integral para alunos e professores é condição sine qua non para assentar essa nova universidade.

A universidade que Darcy criou tem, pois, um traço que a distingue das demais: é uma instituição acadêmica plenamente consciente de sua responsabilidade formadora do “novo humanismo fundado nas ciências básicas, nas tecnologias decorrentes e em novas questões sobre a vida e sobre o homem que elas estão suscitando.” Para realizar essa tarefa seu Corpo Docente-Pesquisador e seus alunos devem ter Dedicação Integral. Aliás, Darcy chamava de “escolão” as instituições de ensino superior que adotavam o regime hora-aula para o exercício da docência. Sem dúvida, o regime Escolão traz conseqüências nefandas para a UENF, entre elas a perda do lugar que ora ocupa no rank das avaliações de universidades feitas pelo MEC e por organizações internacionais, posto que o regime de tempo integral e dedicação exclusiva é uma variável importante utilizada para medir a qualidade do desempenho de universidades. 

Pois bem, essa proposta do Colegiado Executivo parece ser a expressão mais corrompida e depreciativa do mérito do empreendimento Darcy Ribeiro porque é um vírus que ataca principalmente o seu espírito. O modelo Darcy para a universidade moderna é, para todos nós que aqui estamos tentando concretizá-lo, uma enorme esperança que, por desgraça, pode vir a ser apenas uma ilusão despercebida. É preciso lutar bravamente contra os caminhos da desilusão porque em tempos duros as ervas daninhas vicejam com intensidade mortal. Por que não perguntamos a população campista, que tão bravamente lutou pela criação de uma universidade pública na cidade, se ela prefere o modelo Darcy de universidade ou o Escolão do vice-reitor?

Em tempos de aniversário da UENF deixo aqui registrada a saudação do seu fundador: “saúdo daqui a Universidade Estadual do Norte fluminense, que há de ser, no mundo das coisas, tal como a historia a fará. Desejando que dê ouvidos para as diretrizes que proponho e que faça suas as ambições generosas que lhe atribuo.” Com certeza, a principal diretriz  é que prevaleça sempre, entre os que nela hoje estão, menos ambições pessoais e mais espírito público. Isto significa que será preciso acelerar a retomada de um governo, organizado da melhor maneira nos moldes da Civilização Democrática, de modo a proporcionar ótimas condições de vida acadêmica, cada vez mais dinâmica e menos burocrática e ditatorial.

Há um adágio mineiro que diz: prudência e caldo de galinha não fazem mal a ninguém. Prudência, senhores!

Yolanda Lima Lobo é professora associada do Laboratório de Gestão e Políticas Públicas (LGPP) do Centro de Ciências do Homem da UENF

Postagens mais visitadas deste blog

ADUENF envio ofício ao reitor da UENF requisitando informações sobre condições para funcionamento

Nota de Repúdio contra o abuso de autoridade no arrombamento do DACOM da UFF Campos