SALAS DE AULA COMO ESPELHOS DA CRISE

Na história de lutas da UENF, destaca-se a que foi travada há dez anos pela autonomia administrativa. Um dos mais fortes argumentos na ocasião era de que uma fundação exógena não teria a sensibilidade para priorizar as questões acadêmicas em relação às demandas da máquina administrativa. Atualmente, no entanto, em pleno século XXI, numa universidade que se pronuncia como das melhores do país, existem salas de aula que poderiam se constituir, sem qualquer exagero, em cenário de fotografias de Sebastião Salgado. Faltaria só escolher o personagem certo, um professor desolado ou um aluno perdido, mirando o infinito, para acabar de compor a cena.
Mas como foi possível chegar a esse ponto? Como se justifica o descaso com o que há de mais emblemático na atividade docente: a sala de aula? Como se justifica a apatia dos professores diante dessas condições? Humm. Essa última nem é tão difícil de entender. Junte-se a corrosão de salários com um modelo de administração centralizador, que se contrapõe ao plano diretor e que prescinde da participação da comunidade, e o tempo se encarrega do resto.

Nem sempre foi assim.

Houve um tempo, por exemplo, em que cada Laboratório elaborava seu orçamento, que passava a integrar o orçamento do Centro, que, por sua vez, consolidado juntamente com os demais, compunha o orçamento da instituição, a ser submetido ao CONSUNI. Tudo bem que o orçamento nunca era executado plenamente, mas, ao menos, era elaborado por quem lidava de perto com as atividades acadêmicas. Na atual distopia uenfiana tudo é concebido num distante Olimpo, de onde tudo emana.

A instituição adoeceu, é óbvio.

Quadros jovens e com excelente formação vêm partindo em busca de melhores condições salariais em outras Universidades. Durante anos isso foi negado oficialmente. Como se isso resolvesse o problema do êxodo. Não resolveu, é óbvio. Agora, dos oráculos certamente surgirão argumentos de que isso tudo é uma maldade, que uma ou duas salas de aula temporariamente em más condições não são representativas do conjunto e coisas do gênero. É óbvio. Pode até ser, mas desconheço qualquer delas que não seja desconfortável e anacrônica. Como uma vitrola ou um rádio a válvula.

E, além do mais, basta uma sala, como basta um tumor, para evidenciar o óbvio. Poucas coisas são tão difíceis de se contestar quanto o óbvio. O óbvio não fala. Grita. É superlativo.

Carlos Eduado Novo Gatts é Professor do Laboratório de Ciências Físicas do Centro de Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual do Norte Fluminense.

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