Especial Educação: UENF, patrimônio do povo do norte fluminense abandonado pelo governo do Estado


A Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF) é uma universidade pública estadual, sediada em Campos dos Goytacazes, inaugurada durante o governo de Leonel Brizola, com a assistência de Darcy Ribeiro. É a primeira universidade brasileira a possuir 100% de professores doutores e, em 2012, foi reconhecida pelo Ministério da Educação como a melhor universidade do estado do Rio de Janeiro e a 11ª no país no Índice Geral de Cursos (IGC) de 2011. A Universidade também  foi considerada a melhor universidade fluminense pelo resultado do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade), onde ocupa a 6ª colocação entre todas as Universidades do país. Hoje, mesmo com todos esses números, a UENF luta para sobreviver e quem tem garantido seu funcionamento são os trabalhadores.
Mais uma vítima da crise generalizada que vive o Rio de Janeiro, a universidade é mantida pelo esforço de professores, estudantes e técnicos-administrativos que se superam para evitar o que seria o fechamento da mesma. A professora de Sociologia, Luciana Silva, presidenta da Associação Docente da UENF (ADUENF), classifica a situação da universidade como sendo “ocupada”:
“Tenho dito publicamente que, nesse momento de crise do estado, a UENF poderia ser classificada como uma universidade que nós estamos ocupando. Estamos há mais de um ano ocupando esses prédios, arcando com os custos internos, com dívidas bastante significativas tanto junto à Águas do Paraíba, que é a empresa que fornece a água, tanto junto à ENEL, que fornece energia elétrica.”
A professora relata dificuldades mesmo com o espaço ocupado.  Entre os principais problemas enfrentados estão a questão da segurança e da manutenção básica do local. A limpeza, apesar de não estar no quadro ideal, é mantida, mas os problemas se segurança e condições básicas para o funcionamento são constantes. A universidade convive com ameaças de corte de luz e chegou a ter a luz de uma de suas unidades cortadas e a segurança é uma questão ainda mais grave:
“Estamos com problemas gravíssimos de segurança porque a empresa terceirizada se retirou. A empresa ficou trabalhando 6 meses sem pagar os funcionários e se retirou no fim do ano passado. Nós já tivemos caso de assalto com refém numa unidade agrícola da UENF, que fica mais afastada por conta do hospital veterinário, e também já nos deparamos com animais silvestres roubados e furtos dentro do campus.” – relata a professora.
Luciane conta que entrou numa universidade pujante, muito viva, cheia de pesquisa científica e com atrativos salariais interessantes para iniciantes de carreira. Segundo a docente, as greves até o ano de 2016 eram em sua maioria por melhorias salariais e reposição da inflação. Agora, a universidade só não para as atividades para não tornar a situação ainda mais dramática:
“Nós não paramos as aulas por aqui por uma avaliação de que interromper as aulas seria ainda mais dramático. Mas, o fato é que nós estamos funcionando com uma precariedade enorme.” – desabafa Luciane.
A presidenta da ADUENF comentou que as negociações não avançam. Ela relata que, no ano passado, o comando de greve chegou a se reunir com o líder do governo, à época o Deputado Albertassi, que propôs que os trabalhadores saíssem da greve para que houvesse posterior pagamento das despesas de custeio: nada foi cumprido por parte do governo.
“As negociações que tem sido feitas e são fartamente divulgadas pela mídia, seja a grande mídia ou os blogs alternativos, avançam muito pouco. Publicamente, o próprio Secretário de Ciência e Tecnologia, Pedro Fernandes, esteve na UENF e reafirmou a promessa de que se não resolvesse o salário entregaria o cargo. Mas o fato é que nós continuamos com 2 meses atrasados, sem o décimo terceiro, com um nível de endividamento gigantesco. Quando os professores são dedicação exclusiva, que é o nosso caso onde 100% dos professores são dedicação exclusiva, isso ainda tem um impacto maior no cotidiano das pessoas que não possuem outra fonte de renda.”
As pesquisas também são prejudicadas. Os professores mais antigos estão dilapidando suas verbas para manutenção das pesquisas essenciais. Enquanto os professores se sacrificam, a universidade segue sendo premiada pelas pesquisas que consegue manter. Recentemente, inclusive, sua pós-graduação foi premiada na área de pesquisa, no entanto, tudo é mantido com dificuldade, sacrifício e incertezas quanto ao futuro:
“As pesquisas ficam inviabilizadas porque boa parte dos nossos alunos são bolsistas. Ou são bolsistas por cotas, ou por iniciação científica ou de projetos de extensão. Então, sem a regularidade dessas bolsas, nós estamos vivendo a situação que a UERJ também vive, de que as pessoas não conseguirem se deslocar das suas residências ou das suas cidades até a universidade. Nós tínhamos um sistema de transporte, por conta da localização em Campos, para fazer campo ou levar estudantes em visita à museus no Rio. A gente agendava um ônibus, um funcionário ia junto e os estudantes iam todos juntos passar um dia no CCBB, um dia fazendo pesquisa no Rio. Isso tudo, agora, não existe. Não temos gasolina e nem como fazer manutenção no transporte.”
Localizada em Campos dos Goytacazes, a UENF possui, aproximadamente, entre aulas presenciais e polos de licenciatura à distância, 7000 alunos distribuídos em todas as cidades do entorno: Macaé, São Fidélis, Itaperuna, Conceição de Macabu, chegando até em Vila Velha, em Minas Gerais nas cidades fronteiriças, e na região metropolitana do Rio de Janeiro. É um grande patrimônio do povo do norte e noroeste fluminense e, segundo a professora Luciane Silva, representa muito mais do que apenas uma universidade:
“A UENF é um polo dinamizador de mobilidade social ascendente para estudantes que são filhos de agricultores ou de trabalhadores no comércio com pouca qualificação. O perfil dos alunos que estudam na UENF é o perfil de uma classe popular, de uma classe média baixa, bem diferente do perfil de uma UFRJ ou de outras universidades federais no Brasil. Para esses alunos, a UENF representa uma possibilidade muito mais do que uma formação ou profissionalização, de uma própria transformação estrutural de suas vidas. Ela é um patrimônio da região norte-noroeste fluminense, sendo entendida e abraçada como tal pela população.”
Em 2016, a mobilização da comunidade da UENF alcançou 15 mil assinaturas na comunidade em defesa da universidade. Apesar dos problemas, a universidade está na pauta pública da cidade de Campos e representa a grande oportunidade para mudar a vida de milhões de jovens da região. A gestão da educação no estado do Rio de Janeiro, no entanto, transforma esses sonhos em pesadelos e incertezas. Diante de toda essa situação, a presidenta da ADUENF não aceita o discurso de crise do estado e pede uma auditoria na dívida pública para que o discurso verdadeiro venha à tona:
“A gente já tem uma clareza enorme sobre o fato de ser uma crise seletiva e sobre as possibilidades que o governo do estado tem de arcar com a folha de pagamento das universidades estaduais. O que a gente tem visto é um terror praticado contra os servidores. A ADUENF lançou uma campanha pela auditoria da dívida pública para que o estado abra suas contas e pare com discurso mentiroso. Nós sabemos sobre a situação de arrecadação do estado e queremos que o estado cumpra com a lei e pague os servidores, pague os professores, os técnicos-administrativos e as bolsas.”
 Texto: José Roberto Medeiros | CTB RJ
Fotos: Reprodução Internet
FONTE: https://ctbrj.wordpress.com/2017/07/05/especial-educacao-uenf-patrimonio-do-povo-do-norte-fluminense-abandonado-pelo-governo-do-estado/

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